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Neurocontabilidade: a caixa preta dos modelos de decisão economicos

A neurociência vem contribuindo para a análise do processo de tomada de decisão. Em termos de descobertas relevantes sobre o funcionamento cerebral, estudos nas últimas décadas mostram que: o cérebro age de forma especializada, mas também integrado. Portanto não há como saber qual área responde a um comportamento específico com 100% de confiança.

 

O cérebro tem plasticidade, ou seja, responde ao ambiente de diferentes formas à medida que seus sistemas se tornam gradualmente mais velhos e instalados. A atenção e a consciência não estão presentes em todas as situações que envolvem raciocínio e decisão; face a essa capacidade automática as pessoas são capazes de demonstrar experiência baseada na intuição e no reconhecimento dos padrões (BEAR, CONNORS, PARADISO, 2007).

 

Um estudo foi realizado para analisar a contribuição de estudos em Neurociência para modelar o processo de tomada de decisão. O estudo apresenta dois modelos teóricos baseados em Psicologia Cognitiva e Neuroeconomia, que são utilizados para criar um novo modelo teórico.

 

A principal contribuição deste estudo é que analisa as decisões relativas ao estabelecimento de níveis de metas orçamentárias, uma decisão mais complexa do que a decisão entre duas ou mais alternativas possíveis, como proposto nos estudos utilizando a Teoria da Perspectiva. Na estimativa os gestores devem levar em conta as informações sobre o ambiente interno e externo e as consequências da escolha um em relação a outra. As consequências não são claras, pois não conhecem todas as outras alternativas possíveis. Este estudo confirma o modelo proposto que leva em conta algumas variáveis consideradas na caixa preta dos modelos de decisão da teoria econômica, como atenção seletiva, memória, raciocínio, perícia e intuição.

 

O estudo apresentou dois modelos de tomada de decisão, um linear (PENNINGS, GARCIA, HENDRIX, 2005) e um bidimensional (CAMERER, LOEWENSTEIN, PRELEC, 2005; CAMERER, 2007. A partir desses dois modelos, ele propõe um novo modelo teórico para analisar o processo de tomada de decisão, considerando a integração dos dois eixos de análise propostos pelo modelo bidimensional e a influência da Intuição no desenvolvimento e armazenamento de alternativas à decisão.

 

O modelo proposto contribui para a discussão de possíveis aplicações da Neurociência em Contabilidade, análogas à Economia (Neuroeconomia) e ao Marketing (Neuromarketing). Por isso, sugerimos o nome de Neurocontabilidade para o estudo dessa natureza inserido no campo da Contabilidade Comportamental.

 

O modelo de equação estrutural permitiu o teste das quatro hipóteses propostas. Os resultados forneceram evidências empíricas ao modelo integrado proposto. Os resultados também demonstraram que, ao tomar decisões sobre o nível das metas orçamentárias, os gestores declaram que:

1) fazem uso da tomada de decisão de processamento controlado (BAZERMAN, 2004, PENNINGS, GARCIA, HENDRIX, 2005; PLOUS, 1993; WALD, 1947);

2) utilizam informações internas e externas para auxiliar as metas orçamentárias estimadas (EMBY, 1994; PENNINGS, GARCIA, HENDRIX, 2005; SIMON, 1955; BAZERMAN, 2004); 

3) são influenciados por outras pessoas no ambiente de decisão (BAZERMAN, 2004) e o foco da cultura organizacional na relação interpessoal reforça essa tomada de decisão em grupo;

4) são influenciados, ainda que em baixa proporção, por medo e/ou incerteza em uma tomada de decisão arriscada, seja para si mesmo, para a empresa, ou para seus membros de equipe (PENNINGS, GARCIA, HENDRIX, 2005; SIMON, 1955).

 

A partir da análise do resultado, pode-se inferir que o tomador de decisão utiliza parâmetros definidos pela organização ao seu processo controlado de tomada de decisão, podendo ser na forma de metas predefinidas, ou na forma de processos padrão para estimar metas. O nível ideal estimado será o resultado da análise das probabilidades e possibilidades de ocorrência de cenários, bem como do uso da experiência passada com estimativa de metas orçamentárias e do uso de informações sobre os ambientes interno e externo.

 

A experiência faz parte do processamento automático na decisão e seu uso não garante um acesso introspectivo, ou seja, o tomador de decisão não é capaz de dizer claramente quais parâmetros ele usou para tomar a decisão além da experiência profissional e pessoal ou as informações disponíveis em sua própria memória.

 

Os resultados também demonstraram que o sistema afetivo é percebido como uma influência para o processo de tomada de decisão em um ambiente de contabilidade. O medo é uma das variáveis que influenciam a decisão, tanto no processamento automático quanto no controlado.

 

Os resultados da pesquisa sugeriram que há decisões baseadas na ancoragem heurística (as metas são ajustadas de acordo com o orçamento do ano anterior), em heurística representativa (em comparação com padrões previamente definidos) e em heurística de disposição (utilizando mecanismos de aprendizagem e memória anteriores para definir metas orçamentárias).  

 

Decisões baseadas em heurística podem ser adequadas a um ambiente incerto, típico de organizações inovadoras, como a empresa estudada. Nessas situações as decisões são tomadas através de processos automáticos que são mais rápidos do que processos controlados. Isso ocorre porque em um ambiente incerto não há uma grande quantidade de informações e o tomador de decisão deve usar heurística.

 

Pode ser que as metas de curto prazo envolvam mais decisões baseadas na heurística do que nas metas de longo prazo. O grande desafio dos Sistemas de Controle de Gestão em uma organização inovadora é entender as tensões geradas pelas metas conflitantes, uma vez que as metas para curto prazo podem ser alteradas de acordo com os diferentes níveis de taxa de crescimento da organização, conflitantes com as metas de longo prazo, gerando as chamadas Tensões Dinâmicas (OYADOMARI, FREZATTI, MENDONÇA NETO, CARDOSO, 2009). 

 

Assim, as evidências do uso da heurística sugerem que pode ser necessário rever os Sistemas de Controle de Gestão da empresa, especialmente o processo de definição do orçamento.  

 

FONTE: Perez, G., & Cesar, C. (2010). Neuroaccounting contribution to understanding the decision making: an example from an innovative company. Disponível em: Neuroaccounting contribution to understanding the decision making: an example from an innovative company.